quinta-feira, 22 de março de 2018

Quais os vírus mais mortais identificados até hoje?

Do UOL, em São Paulo 04/11/2014

Vírus Marburg, documentado por Frederick A. Murphy, do CDC nos EUA, em 1968: mais letal do planeta
Vírus Marburg, documentado por Frederick A. Murphy, do CDC nos EUA, em 1968: mais letal do planeta.

Eles nem possuem células e são microscópicos, mas estão entre os seres mais temidos do mundo: os vírus. A característica que torna esses parasitas tão ameaçadores é sua capacidade de reprodução, que depende da invasão de uma célula viva.
"A maioria dos germes com os quais temos contato não causam doenças", lembra o infectologista Esper Kallas, membro do corpo clínico do Hospital Sírio-Libanês e professor associado da USP (Universidade de São Paulo). Dos milhares de vírus e bactérias identificados até hoje, são poucos os que levam seres humanos à morte. Apesar da fama que os patógenos carregam, Kallas explica que, do ponto de vista evolutivo, não é vantajoso para um parasita matar seu hospedeiro. Ocorre que, por razões que às vezes são mera coincidência, um vírus que convive muito bem com determinado animal passa a infectar humanos, que não estavam preparados para o ataque. É o que ocorreu com o ebola, provavelmente advindo de morcegos ou de algum parasita desses animais.

Distúrbio ecológico
Vale lembrar que certos micro-organismos só "convivem bem" com determinados animais porque, ao longo de milhares de anos, a seleção natural perpetuou as espécies mais resistentes.
Quando a ecologia de um micro-organismo sofre um distúrbio, porém, e os seres humanos entram em contato com o agente pela primeira vez sem que tenha havido um processo de adaptação, muita gente morre até que os mais resistentes comecem a prevalecer. É claro que o ser humano não pode esperar tanto, por isso tem lutado arduamente para combater, ou pelo menos controlar, esse patógenos inconvenientes. Os vírus considerados mais perigosos do mundo têm origem na África e fazem parte das chamadas doenças negligenciadas, como observa Kallas.

Os piores
Na lista dos vírus considerados mais mortais do mundo estão os da família Filoviridae, que provocam febres hemorrágicas graves. Dois gêneros de filovírus estão no noticiário atualmente: o ebola, que já causou pelo menos 5.000 mortes este ano, e o Marburg, considerado ainda pior. Batizado com o nome de uma pequena cidade alemã, local onde o vírus foi documentado pela primeira vez, o Marburg tem uma taxa de mortalidade de aproximadamente 90% (ou seja: a cada 100 infectados, 90 morrem). Assim como o ebola, sua origem é a região que compreende Uganda e Quênia. No último dia 5, o governo ugandense anunciou a morte do membro de uma equipe médica de um hospital em Kampala, que teve contato com uma pessoa contaminada com o Marburg. De tempos em tempos, esse vírus causa mortes na região, mas em proporções bem menores que a da atual epidemia de ebola, cuja mortalidade também pode chegar a 90%, dependendo do tipo de vírus e do local afetado.
Outro vírus que costuma gerar pânico e está na lista dos mais perigosos é o da gripe aviária, o H5N1. Com uma taxa de mortalidade de aproximadamente 70%, esse tipo de influenza raramente afeta humanos, tanto que os casos mais recentes foram na Ásia, onde muita gente vive em contato direto com aves de criação.
O infectologista Esper Kallas também recorda o pânico disseminado em 2002 e 2003 com o vírus da Sars (Síndrome Respiratória Aguda Grave), considerada preocupante porque a transmissão ocorre por gotículas de saliva lançadas no ar (no caso do ebola, é preciso haver contato com sangue, secreções ou tecido). A taxa de mortalidade era de 50%. Uma versão parecida de coronavírus surgiu em 2012 na Arábia Saudita, ganhando o nome de Mers (Síndrome Respiratória por Coronavírus do Oriente Médio).
Também no "ranking" estão os hantavírus (há diversos deles, todos pertencentes à família Bunyaviridae), que são transmitidos por roedores. A primeira descrição ocorreu na década de 1950, durante a Guerra da Coreia, tanto que a palavra deriva do nome de um rio, o Hantan.
Outros vírus menos conhecidos, mas igualmente ameaçadores, são o de Lassa, também transmitido por roedores, o Junin, associado à febre hemorrágica argentina, o Machupo, causador da febre hemorrágica boliviana, o vírus da CrimeiaCongo, transmitido por carrapatos assim como o vírus da floresta de Kyansur, identificado na Índia em 1955.
Embora a maioria dos vírus considerados mais assustadores sejam provenientes de animais, Kallas lembra que há um vírus essencialmente humano que continua fazendo vítimas todos os anos: o da dengue.

Resistência
Se a taxa de mortalidade é, para nós, o fator mais preocupante, há outras questões que devem ser levadas em conta quando se pensa no perigo representado por um vírus -- um deles é a resistência aos remédios desenvolvidos contra eles.
Esper Kallas cita o exemplo do HIV, que possui uma taxa de mutação muito elevada, o que facilita o processo de resistência. É por isso que é tão difícil criar um medicamento definitivo ou uma vacina contra a Aids, mas o antiviral usado contra o herpes há anos ainda controla facilmente a doença.
Também não é possível dizer que vírus são piores que bactérias. "Tudo depende do agente, das condições em que a doença surge e da disponibilidade de tratamento", comenta o infectologista, lembrando que a meningite bacteriana, no Brasil, chega a ter uma mortalidade de 70% em crianças. 

Fonte: UOL Notícias - Ciência e Saúde

terça-feira, 20 de março de 2018

Febre amarela: vírus avança 70 km em 30 dias, diz estudo

Pesquisa genética do Instituto Adolfo Lutz revela que vírus emergiu em 2013 na Amazônia e que tendência é continuar a se expandir  

Estudo inédito do Instituto Adolfo Lutz, previsto para ser publicado na revista científica Science, revela que o vírus da febre amarela percorre 70 km em 30 dias. Além disso, que se trata de uma linhagem emergente – vírus detectado há pouco tempo –  da Amazônia e está circulando no país desde 2013.

E ainda: o vírus que afeta São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro tem a mesma origem e chegou a essas regiões ao mesmo tempo e no mesmo período.

Vírus se dirige para onde encontra vetor
Vírus se dirige para onde encontra vetor

Todas essas informações foram obtidas por meio do sequenciamento do material genético do vírus da febre amarela. "Foi possível entender a diversidade genética do vírus e o caminho que ele percorre”, afirma o pesquisador Renato Souza, diretor técnico do Núcleo de Doenças de Transmissão Vetorial do Instituto Adolfo Lutz.

Ele explica que, para chegar a esses dados, ele relacionou o ponto geográfico de origem do vírus a tempo e distância. “O material genético é como se fosse uma linha de dados, que vai ter certa variação. Essa variação pode ser associada a tempo e distância de um gráfico. Então, consigo perceber quando um vírus saiu de Campinas, por exemplo, e chegou a São Paulo”, diz.

“Posso observar se acumulou diferença e quanto de diferença acumulou, conseguindo saber qual a velocidade que se movimentou de um ponto a outro”, acrescenta.

Já o caminho que o vírus vai seguir é aleatório, segundo o pesquisador. “Não diria que ele vai para a esquerda ou para a direita. Ele vai para onde tiver sucesso, onde encontrar vetor e hospedeiro”, explica.

O exame de PCR, também conhecido como teste molecular, foi utilizado para identificar o material genético do vírus da febre amarela para, a partir daí, ser feito o sequenciamento genético. “Para alcançar o grau de diversidade do material genético observado em laboratório, o vírus que circula atualmente no país emergiu há um tempo atrás, pelo menos em 2013, e a tendência é que continue sua expansão”, diz Souza.

O mito de Mariana

O desastre de Mariana como possível desencadeador do surto de febre amarela em Minas Gerais, que teve início em 2016, é totalmente descartado por pelo pesquisador do Adolfo Lutz.

Local da maior tragédia ambiental do país, onde vilarejos foram destruídos com o rompimento da barragem de Fundão em 2015, Mariana é o epicentro da febre amarela em Minas Gerais com 25 casos e sete mortes, de acordo com o último boletim da Secretaria Estadual da Saúde divulgado nesta terça-feira (13).

Apesar da amplitude do desastre, ele afirma que não afetou as populações relacionadas com a febre amarela – o mosquito e o vírus. “Falam que o desastre matou peixe que comia mosquito. Mas o mosquito da febre amarela se reproduz em água acumulada em oco de árvore”, diz.

A grande incidência de febre amarela neste momento no país é vista por Souza como algo “absolutamente natural”. “A doença tem avançado ao longo do tempo para além de suas fronteiras originais. Há evidencias claras da periodicidade entre períodos de reemergência, como o que vivemos agora, e período onde o vírus retorna à sua área endêmica”.

De acordo com o pesquisador, a área endêmica responde a 26% dos casos de febre amarela e as regiões não-endêmicas, a 74%. “Não existe mais fronteira entre a mata e a presença humana. As casas estão inseridas em ambientes mais preservados. Essa mistura de ambientes faz com que o vírus esteja muito mais próximo de nós”.

O número de casos e de mortes em decorrência da doença são maiores que nos anos anteriores, segundo ele, porque o vírus encontrou um maior contingente populacional suscetível – não vacinado. “A febre amarela chegou ao Norte de Minas Gerais e ao Espírito Santo, por exemplo, onde o vírus não circulava havia 70 anos. Ele não encontrou nenhuma barreira ali e circulou amplamente”, diz.

Pesquisa em macacos contaminados

Souza explica que até pouco tempo atrás, os testes em laboratório em relação à febre amarela eram feitos em camundongos. “Por questões éticas, já que o uso de animais em laboratório está sendo universalmente eliminado, nós utilizados atualmente para o isolamento do vírus células C6 e C36 que são de Aedes albopictus continuadas em laboratório. A presença do vírus na superfície da célula é evidenciada por uma substância que permite que ela brilhe em microscópio”, diz.

O pesquisador afirma que o Instituto Adolfo Lutz está monitorando animais do zoológico e de outros parques como medida preventiva para detectar transmissão da doença. Segundo Souza, o instituto tem trabalhado com tecido de mais de 2.500 macacos que morreram em decorrência da doença, a maioria bugio, macaco preto e sagui. “A partir desses animais conseguimos encontrar o vírus, isolar e produzir sequencias. A sequência do material genético é muito interessante para entendermos como o vírus está caminhando, seu processo de dispersão”.

Macacos: vítimas e alidados no combate à febre amarela

Além de não serem os responsáveis pela transmissão da febre amarela, os macacos ajudam  mapear a presença do vírus no ambiente. Ao confirmar a morte de um macaco pela doença, as equipes de vigilância sanitária e controle de zoonoses conseguem mapear áreas de risco e organizar campanhas de vacinação.

Fonte: Notícias R7.