Realizado pelo Centro de Pesquisas em Alimentos da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP, o estudo analisou as medidas de higiene, manipulação e armazenamento de alimentos junto a 5 mil pessoas de todos os Estados brasileiros
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), todos os anos cerca de 600 milhões de indivíduos no mundo adoecem e 420 mil morrem em decorrência de doenças transmitidas por alimentos (DTA). No Brasil, entre 2000 e 2018, foram registrados oficialmente 247.570 casos de DTA com 195 mortes, segundo dados do Ministério da Saúde. E qual foi a origem principal da contaminação apontada pelo estudo? A cozinha da própria casa.
Diante desses dados, os pesquisadores do Centro de Pesquisas em Alimentos, também chamado Food Research Center (FoRC), da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP, realizaram um estudo para analisar os hábitos de higiene e práticas relativas à higienização, manipulação e armazenamento dos alimentos nas residências dos brasileiros. Os resultados mostram que uma parcela expressiva da população adota medidas inadequadas. Portanto, está mais exposta às DTA. Feita com 5 mil pessoas de todos os Estados brasileiros (a maioria mulheres entre 25 e 35 anos e com renda entre 4 e 10 salários mínimos), a pesquisa também verificou as temperaturas das geladeiras de 216 residências no Estado de São Paulo.
Cerca de 46,3% dos participantes disseram ter o hábito de lavar carnes na pia da cozinha, 24,1% costumam consumir carnes malcozidas e 17,4% consomem ovos crus ou malcozidos em maioneses caseiras e outros pratos. “Lavar carnes, especialmente a de frango, na pia da cozinha pode espalhar potenciais patógenos no ambiente, representando uma prática de risco”, explica o coordenador da pesquisa, Uelinton Manoel Pinto, professor da FCF e integrante do FoRC.
Segundo ele, o consumo de alimentos de origem animal malcozidos ou crus também apresenta risco microbiológico, já que o recomendado é cozinhar o alimento a uma temperatura mínima de 74°C para garantir a inativação de patógenos que podem estar presentes no produto cru. “Lembrando que nem todo produto cru de origem animal contém micro-organismos patogênicos, mas existe esse risco e o cozimento adequado garante que esses micro-organismos sejam eliminados ou reduzidos a níveis seguros.”
Com respeito às práticas de higienização de verduras, 31,3% costumam fazer a higienização apenas com água corrente e 18,8%, com água corrente e vinagre. Para higienização de frutas, 35,7% utilizam apenas água corrente e 22,7%, água corrente e detergente. “Para a higienização segura de verduras, legumes e frutas que serão consumidos crus a recomendação é lavar com água corrente e utilizar uma solução clorada com um tempo de contato mínimo de 10 minutos, seguido de novo enxágue em água corrente”, acrescenta. O porcentual de pessoas que usam água com solução clorada, no estudo, foi de 37,7% (para verduras) e 28,5% (para frutas). Vale ressaltar que vegetais que serão cozidos ou frutas que serão consumidas sem a casca não precisam passar pela desinfecção em solução clorada.
Aprendendo a armazenar os alimentos
Os resultados da pesquisa da FoRC mostram que parcela significativa dos entrevistados realiza práticas de higiene, manuseio e armazenamento de alimentos inadequadas.
Para corrigir estes erros, os pesquisadores elaboraram um material educativo para orientar sobre a forma correta de armazenar os alimentos na geladeira.
Cuidados na refrigeração
Ao fazer compras em supermercados, a maioria dos participantes (81%) não utiliza sacolas térmicas para transportar alimentos refrigerados ou congelados até suas residências. “Em um país como o Brasil, onde as temperaturas chegam facilmente a 30°C em várias cidades durante o ano todo, é fundamental que os produtos perecíveis sejam transportados em condições adequadas, dentro de uma sacola térmica”, destaca Jessica Finger, nutricionista e pesquisadora que conduziu a pesquisa, que teve ainda o envolvimento de um aluno de iniciação científica, Guilherme Silva, graduando de Nutrição da USP.
Com relação às sobras de alimentos, 11,2% dos participantes relataram armazená-las na geladeira passadas mais de duas horas do preparo, o que representa risco à segurança dos alimentos. “Não é recomendado deixar alimentos prontos por mais de duas horas sem refrigeração, visto que a temperatura ambiente favorece o crescimento microbiano nesses alimentos. Essa é uma das principais práticas responsáveis por surtos de doenças de origem alimentar,” acrescentam os pesquisadores.
Evidenciou-se também que era comum entre os participantes descongelar os alimentos em temperatura ambiente (39,5%) ou dentro de um recipiente com água (16,9%), o que também não é adequado, visto que os alimentos devem ser mantidos a uma temperatura segura durante o descongelamento, podendo ser realizado na geladeira ou no micro-ondas.
Armazenamento de carnes
Sobre o armazenamento de carnes na geladeira, a maioria dos participantes (57,2%) relatou armazenar as carnes na própria embalagem que contém o produto. Esta prática é questionável, uma vez que é preciso utilizar um recipiente adequado para evitar o gotejamento do suco da carne e a contaminação de outros alimentos estocados no refrigerador.
A boa notícia é que em relação à temperatura dos refrigeradores, dos 1.944 registros coletados, 91% ficaram entre a faixa de temperatura recomendada, de 0 a 10°C. Este dado é importante, pois pode ser utilizado em estudos de modelagem para prever a multiplicação de micro-organismos nos alimentos refrigerados.
Fonte: Jornal da USP - 12/12/2021
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